20 Outubro 2017

Retrato Mobilidade no Brasil: Sergio Marcolini, Superintendente de gestão da AMTU do Estado do Rio de Janeiro

Entrevista
com Sergio Marcolini

Superintendente de gestão da Agência Metropolitana de Transportes Urbanos do Estado do Rio de Janeiro

Sergio Marcolini, Superintendente de gestão da AMTU (Agência Metropolitana de Transportes Urbanos) do Estado do Rio de Janeiro, tem mais de 20 anos de experiência com mobilidade urbana e nos conta um pouco sobre sua trajetória e como ele enxerga os desafios no setor.

Para começar, você poderia falar um pouco sobre a sua instituição de trabalho?

A Secretaria de Transportes (SETRANS) é responsável pelo planejamento do transporte intermunicipal. No Brasil, as maiores responsabilidades, geralmente, são dos municípios, inclusive a gestão do transporte. No entanto, a gestão do transporte intermunicipal é responsabilidade do Estado, por meio desta Secretaria.

A SETRANS tem várias empresas que cuidam, cada uma, de um modo de transporte: a CENTRAL é responsável pelos trens, a RIOTRILHOS é responsável pelo metrô, o DETRO faz a concessão e a fiscalização dos sistemas de ônibus e a CODERTE cuida dos terminais rodoviários.

Meu cargo é de Superintendente de gestão da Agência Metropolitana de Transportes Urbanos, que é um convênio entre o Estado e os municípios da região metropolitana da qual fazem parte o Secretário dos Transportes, como representante do Estado, e os Prefeitos como representantes de seus municípios.

A ideia é que todos se reúnam para definir a integração das políticas do Estado com as políticas dos municípios. Nosso papel consiste em dar apoio técnico ao Secretário e aos Prefeitos na definição de políticas públicas.

Nos últimos anos, nossa principal atividade foi desenvolver o PDTU, o Plano Diretor de Transporte Urbano da Região Metropolitana do Rio de Janeiro, que é o documento orientador da política de transportes da Região Metropolitana do Rio de Janeiro definido por meio de um decreto do Governador.

Desde quando você exerce este cargo?

Estou na SETRANS desde 2015, há 2 anos.

Qual foi a sua trajetória profissional? Quais suas experiências anteriores e formação acadêmica?

Sou engenheiro civil, formado pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Minha primeira atuação profissional foi na área de meio ambiente, no INEA (Instituto Estadual do Ambiente). Concluí uma pós-graduação em Hidrologia, na Itália, e na UFF também cursei Planejamento Ambiental e Administração Pública. O mestrado foi realizado na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), em Engenharia Urbana.

Quando ingressei no Estado, trabalhava no meio-ambiente, no INEA. Na década de 90, fui cedido à Prefeitura de Niterói e, em 1994, comecei a trabalhar na área de transportes deste mesmo município. Então, acabei fazendo mestrado em Engenharia Urbana e me especializei na área de Transportes. Retornei para o Estado e passei um tempo na Secretaria de Desenvolvimento Regional. Após um longo período fora, retornei e estou há dois anos atuando novamente em âmbito estadual.

O que te motivou a trabalhar com mobilidade urbana? Como você veio parar neste meio?

Quando estava em Niterói, em 1994, a Prefeitura resolveu contratar um primeiro plano de mobilidade urbana de Niterói, chamado PITT (Plano Integrado de Transporte e Trânsito). Um consultor bastante conhecido do Rio de Janeiro fora contratado para desenvolvê-lo, ao que coordenamos este trabalho juntos. A partir daí, comecei a trabalhar com o planejamento de transportes na cidade de Niterói.

De 1994 a 2012, permaneci atuando neste município. Também ocupei cargo de presidente da NITTRANS, empresa pública municipal responsável pelo planejamento do transporte e do trânsito de Niterói. Nesta época, não existia uma Secretaria de Transportes.

Quais as principais necessidades e desafios que você geralmente encontra na área de transportes?

Acho que o principal desafio para atingir os objetivos na área de transportes no Brasil, é a ausência de uma fonte de recursos específica para o setor de mobilidade e de transportes. Na verdade, ela existe. A Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE) é um imposto sobre combustíveis que deveria ser destinado ao Transporte, mas, de fato, houve esse repasse.

Defendo a existência da CIDE e que esta contribuição seja repartida entre os Estados e municípios. Além disso, é necessário que o Governo Federal crie um grande fundo para aplicação e investimento em transportes públicos, de modo que os combustíveis e o transporte individual financiem estes investimentos.

Se não houver uma fonte de recursos específicos para o transporte público, dificilmente ocorrerão investimentos nos próximos anos e continuaremos dependentes da situação econômica do país e do Estado, como é o caso do Rio de Janeiro.

Na sua opinião, qual é o assunto principal em termos de mobilidade hoje em dia?

A moda agora é o TOD (Transport oriented development). Aliás, minha dissertação de mestrado foi exatamente em cima da relação do transporte com o uso do solo, discorrendo sobre esta temática. Contudo, aponto alguns excessos. Defendo-a, acho que o TOD é uma política correta a ser perseguida, mas não é a panaceia que vai resolver todos os problemas. Meus enfrentamentos atualmente têm sido exatamente nesta direção: por ter se tornado moda, parece que o TOD vai resolver todos os problemas de mobilidade numa região complexa como a do Rio de Janeiro, e não vai.

Outro ponto que destaco são os lobbys: o lobby do trilho, o lobby das rodas, o lobby das bicicletas. Como se cada um fosse independente. Na verdade, todos estes serviços são complementares. Existem os defensores do trilho que dizem “tem que ser transporte sobre trilho”. O outro defende “não, tem que ser BRT, porque é mais barato, investimento menor”. Tudo isto é verdade, mas não existe verdade absoluta. O planejamento do transporte é você ter tudo isto. Quer dizer, em alguns locais, sem dúvida, você tem que ter uma rede de metrô. Aqui no Rio, nossa rede de metrô é muito tímida e sua expansão é fundamental. Entretanto, quanto custa a expansão dessa rede de metrô? Ela tem um custo, então esta expansão não atingiria toda a RMRJ, dificilmente isto irá acontecer. Então, tem que existir uma rede complementar, com BRTs, com BRS, com acessibilidade aos locais, bicicletas e pedestres.

Outra coisa que vejo, toda vez que se fala em transporte ativo pensamos na bicicleta, que tem uma contribuição pequena na divisão modal, representando 1%, enquanto o pedestre tem uma participação enorme, de 30%. E ninguém cuida das calçadas. A rigor, embora o TOD esteja na moda, os investimentos em acessibilidade para o pedestre são muito pequenos na prática. Tem muito mais investimento para bicicleta do que para pedestre, o que considero um contrassenso.

Como você se vê nos próximos anos?

Na minha idade, eu planejo continuar trabalhando enquanto conseguir. Poderia me aposentar no próximo ano, mas não pretendo, porque gosto muito de trabalhar com transporte. Sou entusiasta no assunto e enquanto tiver saúde, continuarei trabalhando aqui.

Entrevista realizada em 17 de agosto de 2017